sexta-feira, 30 de maio de 2014

Geiger

CUIDADO! Ela chega sutilmente, quase que sem ser percebida. Ela é linda! Encantadora! Facilmente te seduz. Quando perceber você já a tem por todo o corpo, material e não. Lentamente ocupa todos os espaços, tempos e indefinições da sua vida. Muda tudo. Abala cada mínima estrutura. Tira tudo do lugar e te acomoda em si própria CUIDADO! Ela te põe em estado de total dependência. Nada que não a envolva faz sentido. Finalmente você percebe o que se passa. Mas é tarde demais. Ela já está maior que você. Ou simplesmente independe de você para existir e se fortalecer. Já você... A você resta tratar-se. Talvez infinitamente e sem cura. A você resta reinventar sentido pras coisas que se perderam no caminho. A você resta redescobrir o que é viver sem aquela parte já tão... Você. A você restam as náuseas, o cansaço, a dor, o medo, a insegurança... A você resta também buscar recursos para maquear o estado em que ela te deixou. E sorrir, mentindo para si mesmo que ainda que com aquela massa podre que altera completamente o funcionamento do seu organismo, você está bem. Não se esqueça de sorrir!

domingo, 18 de maio de 2014

Aaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhh

E essa sensação chegando mais uma vez?
Essa bruta flor do querer que engulo a seco, pétalas, folhas, caule, espinhos...
Para onde foi o ninho?

mearrastomearrastomearrastomearrastomearrasto

E essa sensação chegando mais uma vez?
Essa dor da proximidade tão distante, do silencio verborrágico que sangra meus ouvidos...
Para onde foram os gritos?

 chorochorochorochorochorochorochorochorochorochorochorochorochoro

E essa maldita sensação chegando mais uma vez?
Essa angústia persistente do desejar mais não conseguir, do tentar e fracassar, sempre...
Pra onde foram os sonhos, as certezas, o ventre?

perdidaperdidaperdidaperdidaperdidaperdidaperdida

E essa sensação desgraçada invadindo mais uma vez?
Essa merda que me empurra pra outros lados e me espanca quando estou próxima de chegar [a algum lugar?]
Pra onde fui?

AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh! AAAaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!! AAaaaaaaaaaaaaaaaaAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhHHHHhhhH!

Me deixa ser, de novo? me deixa sentir Me deixa ser de novo? Me deixa ser de novo? me deixa sentir Me deixa ser de novo? Me deixa ser de novo? me deixa sentir Me deixa ser de novo? Me deixa ser de novo?

 Me deixa ser?

terça-feira, 13 de maio de 2014

Pegando palavramentos emprestadas


Por Não Estarem Distraídos
 
Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.

Clarice Lispector